―Como é que é? Elae, que história é essa? Desde quando? ―Confesso que ver os olhos do Sakamoto se encherem de lágrimas não foi algo muito legal de se ver, mas eu já estava ficando cansada de toda essa nossa situação. Apenas respirei fundo e coloquei minha mão direita por volta do tronco de Ian, o abraçando de lado.
―Desculpa Sakamoto, mas nós estamos juntos já tem um tempo, só não tive a oportunidade de apresentar vocês antes. Agora se nos der licença estávamos em um assunto muito importante. Depois nós nos falamos.
Ele bufou e se fosse um pouco mais corajoso provavelmente teria tentado agredir o Ian, mas simplesmente abaixou a cabeça. Isso me deu um pouco de dor no coração, apesar dele insistir em voltar e às vezes ser chato, e as vezes que deixava seu lado obscuro surgir, na maioria ele era uma boa pessoa e um ótimo amigo.
―Tudo bem, Elae. Você nunca aceitou quando eu pedia para voltar então agora eu entendo o motivo, desculpa continuar insistindo tanto... Ainda podemos ser amigos? ―Sakamoto levantou o rosto e sorriu de uma forma bem triste, o que me deixou um pouco triste também.
―Claro, sempre fomos amigos e ainda seremos. ―Disse rapidamente sorrindo para ele.
Meu amigo se afastou da porta e olhou de cara feia para o rapaz ao meu lado antes de ir embora de uma vez.
Respirei fundo, mais uma vez, me sentindo um pouco aliviada com o desenrolar dessa situação, e devagar virei meu rosto encarando Ian, ele era um rapaz curioso, soltando minha mão que o abraçava.
O rapaz cutucou meu ombro e quando olhei para sua mão ele me puxou para trás para que pudesse fechar e trancar a porta, ele deveria estar preocupado se aquelas criaturas iriam voltar ou não.
―Ian, continue o que estava dizendo antes. ― Não dei nem tempo para o rapaz respirar, sorri pelo canto dos lábios de uma forma amigável, indicando ter interesse na história, enquanto caminhava em direção ao confortável sofá da sala onde sentei.
―Ah certo... ―Ele respirou fundo e seguiu, também, para o sofá sentando-se ao meu lado. O garoto voltou a ficar tenso igual antes na cozinha, mas dessa vez não fez muitas cerimonias para começar a falar. ―Nosso antigo Sacerdote, aquele na qual todos os reis respeitavam e ouviam, acabou nos traindo. Ele realizava experimentos proibidos usando o DNA de todas as raças de Sacra... Aquelas duas criaturas que estavam atrás de você eram o resultado dos experimentos. Aquele homem criou uma nova raça, uma que une várias outras e tem um poder esmagador.
"Depois de criar vários seres proibidos ele os ensinou a usar nossos feitiços, nossas habilidades de luta e então nossos pontos fracos e com isso ordenou que eles atacassem as cidades. Tivemos sorte que os Lordes se reuniram e conseguiram amenizar o estrago, mas eles não sobreviveram, nenhum deles e nem suas famílias, ou ao menos era o que alguns pensavam..."
Iam antes olhava para frente enquanto dizia, ele parecia ter estado presente nessa "guerra" e pela sua expressão tinha sido algo horrível de se ver. Seu rosto se voltou para o meu, seu olhar estava frio e eu podia jurar que a sala estava mais gelada que antes.
―Antes de mais nada, garota, saiba que tudo o que estou te contando apenas eu sei, então não pense em sequer comentar sobre isso com alguém. Nem mesmo a identidade do traidor é de conhecimento da população.―Ele me lançou um olhar sério que me fez apenas assentir em silencio, não é como se eu tivesse alguém para contar também. Ele mordeu o lábio inferior antes de continuar ―Elae, segundo as informações que me passaram você é possivelmente a filha de um dos Lordes que se sacrificaram para salvar nosso mundo. ―O frio na sala devia estar abaixo de zero já que eu congelei a ouvir as palavras de Ian, senti um calafrio em minha nuca, tentei mover minha boca para dizer que aquilo era um absurdo, mas não consegui. ―Sei que você pode não acreditar, mas eu estou sendo sincero com você e vou ser mais ainda ao dizer que não acredito nisso. A nossa guardiã me disse que você pertencia a uma das famílias mais poderosas de Sacra, mas pelas informações que me foram confiadas pelos meus pais, a única criança deles morreu em um incêndio no casarão e acabou levando a "pena" junto.
―Vamos com calma, por favor. Eu não estou entendendo nada... Como eu posso ser filha desses Lordes? Eu vivo aqui no mundo humano, não sei nada sobre Sacra! E o que é essa pena que todos estão falando? ― Meus lábios se moveram de forma rápida e meu olhar entregava o quão impaciente e irritada eu estava ficando, afinal quem não ficaria? Um estranho surge na sua casa, seus pais somem, e ainda precisa ouvir uma história absurda como essa.
Finalmente estava podendo falar, ainda sentia um grande frio em meu corpo, parecia realmente que estava sendo congelada. Ian me olhou um pouco surpreso, talvez não esperasse que me fosse ver respondendo daquela forma e por mais estranho que pareça a temperatura no ambiente começou a subir novamente, o que me relaxou um pouco.
―Certo... Acho que a melhor forma é te levar até Sacra e lá vamos descobrir o que você é, porque eu posso te dar minha certeza que "humano" não é algo presente em seu DNA. ―Sua voz soava fria e seu olhar estava da mesma forma, eu deveria ter deixado ele irritado, mas a culpa não era minha. Ian se levantou e andou até a porta da cozinha.
―Espera! Essa guerra... Você estava presente? ―Por mais irritada que eu estivesse e por mais absurdo que tudo isso soasse eu não conseguia achar que era uma mentira, ainda mais com as reações dele e claro que estava curiosa.
―Quantos anos você acha que eu tenho? Não sou nenhum velho! Essa guerra começou antes de eu e você nascermos. Mas de toda forma, acabamos presenciando um pouco desta guerra sim, porém, só o final dela.
―Eles... Os seus pais, eles eram Lordes? ― Juntei minhas mãos próximas ao meu peito, estava começando a sentir uma pequena pontada ali, talvez estivesse pensando na situação dele.
―Hm, minha mãe era filha de alguém importante e meu pai, bem eu não sei muita coisa sobre ele. ― Com isso eu pude entender que Ian não gosta de falar sobre ele, ao menos era o que deixa claro. Sorri para ele e me levantei.
―Ah entendi. ―Olhei para os lados e logo suspirei desanimada. ―Ian... Tem alguma forma de saber se meus pais estão vivos? Não esses que me contou, mas os que me criaram...
―Conhecendo aquelas criaturas eles devem ter torturado os dois para tentar descobrir a verdade e no fim... ―Estiquei minha mão pedindo para ele não finalizar aquela frase, já entendia bem o que ele queria dizer.
Voltei a me sentar no sofá sentindo meu corpo pesado, mas não me importei e fechei os olhos, eu estava me sentindo triste demais para pensar em qualquer outra coisa, queria chorar até me sentir melhor. Eu queria, mas não conseguia, acho que nunca consegui chorar durante a minha vida inteira. Forcei meus olhos para ver se conseguia alguma lágrima que fosse, e Ian ainda parado me olhou curioso e um pouco assustado com minha expressão.
―O que você está fazendo?! ―Ele me questionou.
―Estou tentando chorar. ―Disse rápido, com a voz meio falha.
―Certo... Isso não é normal. ―Pude notar um tom de deboche na voz dele, mas o ignorei.
Eu deveria estar forçando demais e já estava começando a sentir tontura e a pontada no meu peito aumentou, além de que estava tendo dificuldades para respirar. Abri meus olhos e procurei o Ian pela sala, mas não o encontrava ali. Ele deve ter voltado pra cozinha.
Tentei chamar por ele, mas minha voz não saia de forma alguma então a única solução era me levantar e ir até o local em que estava, talvez ele tivesse alguma forma de me ajudar. Tentei me levantar algumas vezes, estava difícil, meu corpo pesava muito. Decidi concentrar todas as minhas energias nas pernas para conseguir erguer o corpo e depois de três tentativas consegui empurrar meu tronco pra frente e seguir me arrastando até a porta da cozinha. Olhei para dentro do cômodo e para o meu desespero o garoto estranho não estava lá, meu coração estava batendo muito rápido e doía muito. Notei que meu corpo todo estava suando frio, e meus olhos estavam pesados, quase se fechando. Talvez se eu dormisse iria ficar melhor e a dor insuportável iria embora, não conseguia emitir nenhum som para gritar mesmo.
Fechei os olhos e deixei meu corpo cair no chão, fiquei sem força alguma. Estava quase apagando, deitada no chão gelado, quando ouvi uma voz chamando meu nome.
―Elae? Elae! ―Pude ouvir os passos dele correndo até meu corpo caído e ao se aproximar levantou meu corpo com muita facilidade e levou devolta até o sofá.
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