Lívia pegou o celular da mão de Kaio e escondeu dentro do cofre que ficava no seu quarto.
— Lívia, me devolve, pelo amor de Deus — disse Kaio, atirando uma almofada nela.
— Não, a gente ainda não terminou. — Ela respondeu, atirando a almofada de volta nele.
Kaio ponderou sobre o que ela estava dizendo e resolveu fazer a coisa mais madura, ou seja, ele se atirou no chão e se recusou a se mexer.
— Kaio, falta só a gente limpar o banheiro. Vamos, depois vai acabar.
Parecia que eles estavam fazendo faxina há dias. Kaio estava todo suado, seus braços doíam e ele estava se sentindo em um remake queer de Cinderela. Lívia era a irmã má, claro. Só faltava o Lúcifer e um rato para conversar com Kaio. E para piorar, Leo não estava respondendo suas mensagens.
— Eu não sei limpar banheiro.
— Se eu tive que aprender, tu também vai ter. — Ela estendeu a mão para Kaio se levantar, que ele aceitou sem vontade. — Faz parte dessa coisa que é sair de casa.
Kaio sentiu o peso de suas decisões caírem sobre seus ombros. Mas não tinha nada que ele pudesse fazer agora, além de ser muito corajoso e encarar a limpeza do banheiro. Tentava se convencer disso, pelo menos.
Lívia, por outro lado, estava adorando ficar sentada em uma banqueta na porta do banheiro enquanto dava instruções para Kaio. Ela gostava que seu apartamento acabou virando um centro de reabilitação para jovens mimados, o que incluía ela mesma de alguma forma.
— Ele tem que tá ocupado com alguma coisa, né? — perguntou Kaio, sentado no chão com uma escovinha de banheiro na mão, usando a desculpa que sua pressão tinha caído por um momento.
— Pergunta pra ele, Kaio. — Ela apontou para o armário sob a pia. — Pega um desinfetante ali.
— Não quero. — Ele disse, e ela não sabia se era sobre Leo ou o desinfetante.
Ele ficou de joelhos, sim, era esse o tamanho da humilhação, e se arrastou até o armário. Fazia muito calor, e o fato de que ele só tinha trazido camisetas pretas não estava ajudando.
— Não vai resolver nada assim. — Resposta que servia tanto para a situação com Leo quanto para a limpeza do banheiro.
Kaio poderia perguntar, mas tinha certeza que Leo não queria ser perguntado. Porque, afinal de contas, não tinha nada errado, eles não estavam brigados. Só que se isso era verdade, por que tudo estava estranho? Tentou se concentrar em limpar o banheiro.
Abriu o armário de novo para guardar o desinfetante e reparou em algo que nunca tinha chamado sua atenção, nem mesmo sabia se estava ali antes. Um potinho de tinta de cabelo laranja. Levou a mão e pegou o potinho, deu uma boa olhada pra ver se tinha certeza do que estava vendo. Segurou o pote na altura do rosto de Lívia para ter certeza que estava vendo a coisa certa.
— Que foi? Nunca viu um pote de tinta? — Lívia revirou os olhos diante da surpresa de Kaio. — As pessoas pintam o cabelo, Kaio.
— Eu achava que tu era ruiva natural!
— No meu coração, eu sou. — Lívia passou a mão pelo cabelo que ela retocava a cada duas semanas, religiosamente. — Mas só por enquanto, troco a cor do cabelo de três em três anos.
Kaio não sabia dizer porque ele achou tão incrível o fato dela pintar o cabelo. Talvez porque ele simplesmente nunca tinha conhecido de perto alguém que pintasse o cabelo, ou quem sabe porque ver aqueles tubos de descolorante e um pacote de luvas descartável lembrou ele que pintar o cabelo era possível, era algo que as pessoas faziam. Não era algo que existia só na internet. Ele tocou as pontas do cabelo loiro que estava preso com um elástico roxo de Lívia.
Aquilo até deu algum ânimo pra ele continuar a limpeza. Lívia mostrou como ele devia lavar o vaso, tirar os cabelos (os loiros e os falsos ruivos) do ralo e esfregar o box. Ele nunca admitiria em voz alta para Lívia, mas foi bom aprender alguma coisa.
— Tu acha que eu devia fazer alguma coisa sobre o Leo? — Kaio perguntou, mais tarde, depois que a limpeza finalmente acabou e ele tinha tomado o banho mais merecido de toda sua vida.
Eles estavam no quarto de Lívia. Ela tinha emprestado um cropped para Kaio, porque ele não tinha roupas que não eram de emo. Não que croppeds não pudessem ser roupas de emo, mas os de Lívia obviamente não eram.
— Sim! Tô dizendo isso faz um tempão! — Cruzou os braços — Parece que não me ouve!
— Desculpa, eu tava intoxicado pela quiboa — Inventou, se atirando sobre a cama de casal de Lívia, quase afundando no colchão macio. — Mas eu faço o quê? Amarro ele numa cadeira e obrigo ele a falar comigo?
— Não, eu acho que ele ia gostar um pouco demais disso — disse Lívia. — E aí não ia dar muito certo.
Kaio ficou um pouco envergonhado ao imaginar a cena. Ele não conseguia parar de pensar em um cenário de interrogatório de filme policial, tenso e carregado de homoerotismo. Mas esse não era o ponto agora.
— Lívia, não tá ajudando.
— É tão difícil só chegar e conversar sobre? — Lívia deu uma risadinha irônica. — Ah, espera, esqueci que a gente tá falando do Leo.
— Porra, bem animador esse comentário!
— Mas é verdade, o bichinho foge de conflito, é foda — Lívia se atirou na cama ao lado de Kaio. — Acho que a gente vai ter que planejar isso direito. Eu acho que talvez a melhor coisa seja pegar ele de surpresa.
— Mas como?
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