Após o choque com a bagagem de Erina, Lanie e David ficaram em um transe, com a primeira dizendo “As pessoas ricas são mesmo de outro mundo!” e o último dizendo “Não deveria me surpreender, trabalho aqui a anos… que vergonha…”. Com essas falas já era possível ver que Lanie era uma novata, enquanto David já era funcionário experiente. Quando John se ofereceu para ajudá-nos a carregar as malas, os empregados saíram do seu transe e também se prontificaram para ajudar também.
Com a ajuda dos três, Erina e eu fomos levadas para nosso quartos. Isso mesmo, quartos no plural. Isso explicava o tamanho dos dormitórios, os quartos eram individuais. Erina e eu ficamos com dois quartos do primeiro andar. Cada quarto tinha uma cama, criado-mudo, cômoda, armário, cortinas, biombo, escrivaninha com cadeira, prateleira e estante. Com o básico já fornecido, a decoração ficaria a critério do aluno. Para mim, os quartos estavam de bom tamanho – considerando que são quartos individuais, eu pensei que eles seriam cubículos –, mas para Erina, cujo quarto na mansão da família era maior do que uma sala de aula para cem pessoas, aqueles quartos eram pequenos. Ela teria que pensar em uma outra forma para guardar todos os seus pertences.
Após recebermos as chaves e colocarmos a bagagem nos quartos, John nos levou para passear pelo distrito comercial. Quando John fez a proposta de passeio e pisamos o pé para fora do dormitório, Erina rapidamente cruzou o seu braço com o dele, colando seu corpo ao dele. Que abusada! Vou ter que por um limite nisso!
- Erina, não trate meu irmão como se fosse um mordomo!
- Não precisa se preocupar. – John tentou me tranquilizar – Eu não estou desconfortável, então não há necessidade de repreendê-la.
John, querido irmão, você é ingênuo demais para sua idade! A garota que está se aninhando em seu braço está longe de ser uma moça inocente!
- Maninho, ela é minha amiga. Não precisa tratá-la desse jeito só porque ela tem dinheiro!
- É exatamente por isso que eu não me importo.
- Huh?
Tanto eu como Erina olhamos para ele, confusas.
- Ela é sua amiga e ela te deixa feliz. Ser um membro da alta sociedade deve ser difícil. Por mais que tenha tanto dinheiro, há sempre uma preocupação para manter uma imagem perfeita. Por isso que eu quero deixar ela a vontade, para que ela sempre venha ficar com você. Então eu não me importo.
- John… – Erina suspirou, seus olhos estavam brilhando e ela levou a mão de seu braço livre até os lábios, como uma donzela apaixonada.
Pronto. Agora é que ela não desiste dele.
- Maninho.
- Sim?
- Você é uma pessoa muito boa.
Com a sua mão livre, John fez cafuné na minha cabeça e me deu um sorriso caloroso.
- Não precisa me elogiar! Só de saber que você vai estar com boa companhia já me deixa feliz!
EU NÃO TAVA ELOGIANDO! Quando eu falei que ele era uma pessoa muito boa, eu estava dando um sorriso amarelo, mas ele não entendeu! Foi como eu disse antes, ele é incapaz de ver qualquer malícia na Erina.
Sem que eu ao menos esperasse, John estendeu seu antebraço que estava livre a mim, sinalizando para que eu cruzasse meu braço com o dele. Não sei o porquê de ele estar fazendo isso – talvez eu estivesse um pouco pálida –, mas achei melhor aceitar a oferta para não dar a impressão de que estava chateada com ele. E assim nós três fomos ao distrito comercial, Erina e eu apoiadas em cada braço de John.
Chegando ao distrito, Erina e eu pudemos ver melhor as lojas que havíamos visto de soslaio. Como ainda não era hora de almoçar, nós três poderíamos dar uma olhada nos estabelecimentos. Erina foi quem decidiu para onde iríamos primeiro, quando seus olhos brilharam ao ver um vestido na vitrine de uma boutique. No momento em que ela viu a peça de roupa, ela correu até a loja, consequentemente se soltando do braço de John. Que irônico! Fez questão de se segurar no John e, no primeiro sinal de distração, esqueceu-se dele.
Obviamente, John e eu seguimos Erina para dentro da boutique. Seu nome era Brilho da Seda. Apesar de seu nome, a loja vendia também roupas de outros tecidos. Ao lado da porta em que entramos, encontrava-se a vitrine de exposição, em que manequins posicionados em frente a elegantes cortinas roxas exibiam modelitos atrativos para atrair os compradores para dentro do estabelecimento. O piso da loja era feito de madeira, assim como a metade inferior da parede. A metade superior da parede era feita de tijolos beges. Distribuída pela boutique, haviam araras de roupas e prateleiras apresentando diversos tipos e cores de sapatos, além de manequins vestidos com os trajes mais populares do momento. Próximo ao caixa, encontrava-se alguns provadores de cortinas roxas.
Enquanto acompanhávamos o ritmo de Erina, o atendente da loja se aproximou de nós três. Ele era um homem de cabelos marrons penteados de lado, usava óculos de aro arredondado e se vestia de forma bem aprumada.
- Bom dia! Em que posso ajudá-los? – Ele nos cumprimentou cortesmente.
- Estamos apenas dando uma olhada – Respondi.
- Certo – ele fez um aceno com a cabeça – Qualquer coisa, estarei próximo ao caixa – e se retirou.
Em seguida, senti algo pegar meu braço e me puxar com força. Era Erina, que havia me puxado para um canto da loja com o pretexto de mostrar-me algo. Ela levou a mão para perto da boca, para que John não conseguisse ler seus lábios, e sussurrou com a maior empolgação:
- Óculos!
- Oi? – Questionei, confusa.
- O atendente usa óculos!
- E o que é que tem?
- Que tal ele?
Meu cenho franziu em resposta.
- …Você tá tirando onda comigo.
Erina riu da minha reação e rapidamente teve seu foco direcionado para um vestido que parecia ser caro. Sem algo para fazer, fui até John, que estava olhando de forma analítica para um manequim vestido da seção masculina. Ele parecia estar preso nos próprios pensamentos para notar que eu me aproximei.
- …Esse ficaria bem… – ele murmurou para si mesmo.
- Vai levar esse?
Ao me ouvir, John virou-se com uma velocidade impressionante.
- E-eu só estava olhando… – Ele se justificou, coçando a nuca. Juro que vi um leve rubor em suas bochechas. Estaria ele envergonhado? Não tem pra quê! Que mal tem em eu vê-lo interessado em roupas?!
Olhando para além de mim, John avistou algo que o agradou. Passando por mim, ele foi até uma mesa que tinha cabeças de manequins que apresentavam chapéus e pegou um. Era um chapéu azul bebê de aba longa, amarrado por uma fita roxa. Junto a fita, estava fixado um pequeno aglomerado de esferas roxas escuras que me lembravam a jabuticabas.
- O que você acha? – John me perguntou.
- Eu achei bonito – respondi.
- Acho que ficaria bom em você! Por que não levar?
- …Acho que não terei tantas oportunidades para usar esse chapéu enquanto estiver na escola.
John olhou novamente para o chapéu e acenou a cabeça, convicto. Mesmo com meu comentário, ele decidiu que iria comprá-lo. Será que ele insiste porque ele agora tem um trabalho? Eu já ouvi falar de pessoas que querem presentear os pais e a família usando o próprio dinheiro quando finalmente conseguem um emprego. Deve ser o mesmo caso com John.
- Oi! Vão levar alguma coisa?
John e eu vimos Erina correr até nós, abraçando uma peça de vestimenta próxima de seu peito.
- Estou pensando em levar esse chapéu para a Amaris – John lhe respondeu.
- Hmmmmm… – Erina inclinou a cabeça para mais perto do chapéu e o analisou. Em seguida, virou-se para me avaliar de corpo inteiro e, após olhar de soslaio para o chapéu novamente, ela me disse : – Vai combinar com o seu vestido!
- Obrigada! E o que você vai levar? – Perguntei.
- Esse par de botas aqui – Ela nos mostrou um par de botas de cano alto brancas com cadarço fino e preto e solas marrons – A gente já vai almoçar, então eu não quero andar com várias sacolas. Mas eventualmente comprarei mais.
- Deixe que eu os levarei até o caixa – John se ofereceu, referindo-se às botas e ao chapéu.
- Huhuhu, que cavalheiro! – Erina comentou, entregando de bom grado as botas a John. Após o meu irmão se retirar e estar longe o bastante, ela se aproximou de mim e sussurrou: – Ele cresceu e se tornou um homem de qualidade, não acha?
- …Não dá pra discordar.
- Se você não fosse irmã dele, seria minha rival no amor, não é?
- Não force a barra.
Após John retornar, ele entregou a cada uma de nós uma sacola com o nossa respectiva peça comprada. Erina, então, pegou uma bolsinha de dinheiro guardada em um bolso escondido de seu vestido e tirou dela uma quantia de dinheiro equivalente ao preço das botas. Á princípio, John recusou o dinheiro, mas Erina insistiu até que ele finalmente cedesse.
Em seguida, fomos até a livraria e ficamos olhando os volumes que encontramos lá. A dona da livraria, uma senhora de 40 e poucos anos, era muito simpática e também uma mulher de negócios de boa lábia. Era evidente que ela tinha consigo muitos anos de experiência e os esbanjava com orgulho. Ela ficou nos observando, prestando atenção nas nossas conversas e, quando o momento oportuno chegou, ela se aproximou e deu suas recomendações. A senhora recomendou a Erina um livro de romance de um autor que foca nesse tema e, a mim, recomendou o primeiro livro de uma série de suspense. Mulher esperta! Fez isso para garantir que nós voltássemos para comprar no futuro! De qualquer forma, compramos os livros. Além disso, Erina também ficou vasculhando a loja com o olhar, na esperança de encontrar algum aluno da Academia, e, infelizmente, não encontrou ninguém. Ela terá que ser paciente e esperar a cerimônia de entrada amanhã.
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