Assim, nós três deixamos a estação e adentramos a cidade de Norwill. A primeira coisa que eu vi foram as montanhas no horizonte. Norwill estava acima do nível do mar, mas não era em um nível preocupante em que uma simples caminhada me causaria um desmaio.
A caminhada até a entrada do campus foi surpreendentemente curta. Quando saímos da estação passamos por um pequeno parque, que obviamente era um lugar que era para os viajantes relaxarem. Após esse parque, passamos por, o que creio eu, um pequeno distrito comercial: Uma livraria, uma padaria, uma mercearia, uma floricultura, uma boutique, uma loja de poções, uma loja de penhores, entre outros. Dava para ver que aquela parte da cidade havia sido estruturada levando em consideração a população estudantil de Avalon. Logo após esse pequeno distrito, estava estendido uma curta rua que levava justamente à entrada do campus. Até a gente chegar a ver os murros e portões de ferro da academia, John, eu e Erina tivemos uma conversa curta:
- Academia Avalon… – John suspirou, o que deu início a conversa – a alguns anos atrás, eu era um aluno. Agora, a partir de amanhã, serei um professor.
- Como está se sentindo? – perguntei.
- Como se a ficha ainda não tivesse caído.
- Eu acredito que você será um ótimo professor! – Erina fez um comentário, se intrometendo na conversa – Você já enfrentou muitas batalhas, né? Uma sala de aula não é nada comparado a isso!
- Obrigada pelo incentivo, mas dar aulas e lutar são coisas diferentes – John balançou a cabeça negativamente – Não tem como eu ganhar proficiência em um fazendo o outro.
- Nesse caso, o que lhe resta é ganhar experiência, não é?
John olhou para mim, sem entender ao certo o que eu estava querendo dizer. Vendo que precisaria ser mais clara, continuei a falar:
- Você está nervoso porque nunca foi professor. É normal sentir nervosismo quando se vai tentar algo pela primeira vez. Mas é por isso que você tem que encarar de frente, senão nunca vai perder o medo! Faça o teste! Quando você for se apresentar para sua turma, você vai pensar “Nossa, não foi tão ruim quanto eu achei que seria! Nem sei porque eu tava nervoso!”
Enquanto eu estava falando, eu pude ouvir umas risadas. Eram do John. Já não era mais possível ver aquela expressão de ansiedade em meio ao seu sorriso.
- Hahahaha, sabia você acabou de soar como um tiozão de batalha? – John falou entre risadas. Ele até tentou levantar a mão para afagar meu cabelo mas, ao ver que estava carregando uma mala, ele se lembrou que estava com as mãos ocupadas.
Estava óbvio que ele falou isso para tirar uma com minha cara. Há! Como se ser chamada de “tiozão” fosse me atingir! Irmão bobinho! Você pode ser o mais velho, mas sou eu que tem mais memórias acumuladas.
- Apenas fiz o que era necessário para entrar dentro da sua cabeça dura, maninho! – Respondi descontraída, dando um tapinha em suas costas.
E com “tapinha”, eu quis dizer “tapão”. Levando em consideração que ele era mais forte, eu também quis exibir a minha força, mesmo que fosse pouca. Entretanto, quando minha mão colidiu com as costas dele e fazendo um alto som, senti um ardor rapidamente se espalhar na palma da minha mão. Deusa Protetora, que costas duras! Como é possível?! Tá, eu sempre suspeitei que ele se tornaria excepcionalmente forte, mas não muda o fato que minha mão doeu!
- De qualquer forma… – Voltei a falar com John para me distrair da dor – Acho que nenhum aluno vai notar que você se sente despreparado. Você já está usando um modelito de professor!
John estava vestido uma camiseta de botões por debaixo um casaco aberto da cor azul petróleo, calças cinzas e sapatos marrons. Dava para ver que a camiseta, o casaco e as calças haviam sido bem passadas. Definitivamente John pôs bastante cuidado em sua vestimenta, pois ele realmente parecia um professor. Um professor modesto, porém que levava a sério o seu trabalho.
- Que bom que, pelo menos, minha vestimenta está adequada. Apesar de que eu acho que não ficou formal o bastante. Será que eu deveria colocar uma gravata?
- Não precisa – assegurei – Você está ótimo desse jeito!
- Na verdade… – Erina começou a falar com um sorriso malicioso no rosto, sinal de que ela iria falar algo insinuante – você pode tirar o casaco. Você pode até desabotoar os primeiros botões da camisa, se quiser…
Mesmo olhos se arregalaram. Eu sei que eu estava ciente de que ela tentaria flertar com John, mas o que ela disse foi provocante demais! Acredito eu que ela estava esperando que John ficasse vermelho de vergonha mas, infelizmente para ela, ele apenas riu em resposta.
- Hahahaha! Senhorita Erina, você sabe muito bem entregar frases cômicas! Dava pra ver que a senhorita participou de muitas sociais.
Para o azar de Erina, John parecia imune a suas insinuações. Acho que é porque eu sou a amiga dela ou porque ela é mais nova que ele. Talvez seja uma combinação dos dois. Ou talvez seja porque ele a vê como uma garota de classe. Na verdade, acho que todo mundo que a vê enxerga ela como uma dama elegante da alta sociedade. E não tem como culpá-los. Erina se esforça bastante para manter a sua imagem.
No fim da conversa, chegamos até os portões da Academia Avalon. Como o esperado, eles eram altos, na altura de um caminhão, e eram feitos de ferro. Atravessando-os, chegava-se ao campus. Porém o nosso destino ficava fora do campus, mas era propriedade da Academia. Virando à esquerda, vimos quatro grandes edifícios, um par paralelo ao outro, que tinham um ar acolhedor, mas formal. As pedras das paredes dos dormitórios eram beges, mas as colunas nas paredes eram de um tom mais escuro. A porta era larga o bastante para duas pessoas entrarem juntas com um espaço considerável entre cada uma. Esses eram os dormitórios dos alunos. Se tivéssemos virado à direita, teríamos entrado nos dormitórios dos funcionários.
Fiquei atônita com o tamanho dos dormitórios. Eram tão altos e tão largos que me faziam sentir diminuta. Acho que eles só perderiam para um teatro imperial[1]! Tá, eu posso estar exagerando, mas dá pra entender que são dormitórios bem grandes. E ainda por cima eram quatro dormitórios! Quantos alunos será que cabem em cada um?
- Quatro dormitórios… Os alunos são separados por sexo? – Erina dirigiu-se a John e perguntou.
- Na verdade, não. – ele respondeu, prontificando-se a explicar – É que antes, um dormitório era o bastante para abrigar todos os alunos, mas a Academia ganhou mais prestígio e o número de matrículas aumentaram, então eles precisaram construir mais dormitórios.
- Mas agora que estão em quatro, um número par, por que eles não dividiram entre meninos e meninas? – Fiz o questionamento. Erina me encarou com julgamento. Claramente, ela estava pensando “Não estraga meu momento!”
- Eles optaram por não fazer divisão de sexos para evitar que um dormitório ficasse mais populoso que o outro – após me responder, John ergueu as sobrancelhas, como se tivesse dado conta de algo – Mas não se preocupe! Nunca chegou ao ponto de meninos e meninas terem que dividir o mesmo quarto!
- Fique tranquilo, John! – assegurei – Eu não estava preocupada comigo e com a Erina!
- Não se preocupe, John! Ficaremos bem! – Erina também assegurou.
Olhei de relance para Erina. Dava para ver que ela estava aliviada, mas não porque ela não terá que dividir o quarto com um garoto, mas sim porque vão ter garotos no mesmo dormitório que ela. Não é com a gente que você deveria se preocupar, John, mas sim com os meninos!
Deixando minhas preocupações de lado, nós entramos no dormitório. Nós estávamos na sala de estar do dormitório. Haviam longos sofás e poltronas, ambas da cor do vinho, rodeando uma mesa de centro feita de madeira. Em frente aos sofás e poltronas, havia uma cômoda com um rádio em cima – os avanços tecnológicos desse mundo ainda não chegaram ao ponto de todo mundo ter um televisor em casa – e vasos de planta em cada lado. Também haviam duas estantes encostadas na parede, posicionadas perpendicularmente. Naquele andar também haviam banheiros, cozinha com sala de jantar e depósito. Apesar da atmosfera aconchegante que eu senti, havia um grandioso detalhe que chamava a atenção naquela sala de estar: uma considerável pilha de malas bem em frente as caixas de correio dos futuros estudantes e uma dupla de empregados – um homem e uma mulher –, olhando para tal pilha.
- Hmmmmmm… – o homem analisou um papel que a mulher tinha lhe dado com as etiquetas das bagagens – Realmente, Lanie, todas malas estão no nome de uma pessoa.
- Foi o que eu disse, David! – a mulher, Lanie, retrucou – Todas essas malas… Não é possível que sejam só de uma mesma pessoa! Será que não foi engano.
- Provavelmente um grupo de alunos decidiram juntar a bagagem e colocaram no nome de um deles. – Foi o palpite de David.
- Com licença.
Lanie e David rapidamente se viraram quando ouviram a voz de Erina. Ao ver que possuía a atenção dos empregados, ela prosseguiu com sua fala, portando-se com um ar de educação e elegância.
- Estou procurando pelas minhas malas. Sabem me dizer se elas chegaram? Elas estão no nome de “Erina Banloros”.
- “Erina Banloros”? – Lanie arregalou os olhos pegou o papel da mão de David e o releu os dados – Ah sim, são essas aqui!
Erina juntou as mãos, com um sorriso encantador no rosto e olhos brilhantes.
- Muito obrigada! – Ela fez uma pequena reverência aos dois empregados e depois se virou para mim – Amaris, nossas malas chegaram!
John entregou para nós as malas que havíamos levado na viagem e Erina e eu fomos checar se toda a bagagem havia sido entregue. Enquanto fazíamos a checagem e identificávamos quais malas pertenciam a quem, Lanie e David suspiraram aliviados.
- Viu só, Lanie? – David falou – Eu te disse que provavelmente alguns alunos decidiram juntar as bagagens! Com certeza, cada metade pertence a uma…
- Estão todas aqui!
A fala de David foi interrompida pelo anúncio de Erina e sua hipótese havia sido refutada ao ver a distribuição das malas.
- Mais de dois terços eram malas DELA?! – David e Lanie exclamaram ao mesmo tempo.
Quando eles falaram “dela”, eles estavam se referindo, obviamente, às malas da Erina. A ricaça aqui é ela, não eu! Mesmo eu recebendo muitas roupas e regalias dela, eu nunca serei capaz de supera-lá no quesito de excesso de bens materiais.
John, vendo Erina rodeada de malas, coçou a parte de trás do pescoço e deu uma risada um pouco sem jeito.
- …agora isso está mais parecido com a Senhorita Erina que eu conheço.
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