Ao perceber que tinha o controle sobre aquele mundo, ela compreendeu que tudo dependia dela mesma. No entanto, isso tornava tudo mais complexo do que antes, pois ela se questionava o motivo. O que era aquele mundo? A resposta estava bem diante dos seus olhos, mas ela relutava em enxergá-la. Ela queria se cuidar, sair daquela situação e encontrar a felicidade, vivendo sem ser dominada pelo medo ou insegurança.
Passou o restante do dia teorizando de forma extravagante sobre o mundo, chegando a várias teorias mirabolantes, como ser abduzida por alienígenas, estar presa em uma matriz ou até mesmo o uso de drogas e alucinógenos. No entanto, havia uma teoria que parecia boba demais para ser verdade, mas ela sentia que era a resposta. Ela era o mundo. Essa conclusão surgiu de forma instintiva e direta, sem uma argumentação elaborada. No entanto, o mistério continuava sem uma resolução clara.
A mulher sentiu as lágrimas inundarem seu rosto, formando uma cachoeira que parecia refletir a tristeza que a consumia por dentro. Todas as possibilidades, a confiança que começava a crescer e a pequena alegria que surgia foram levadas por essa torrente de emoções. Ela percebeu que a flor dentro dela ainda não tinha desabrochado, permanecendo apenas como um botão, incapaz de se desenvolver plenamente.
A dor que costumava latejar em seu peito retornou com força total. No entanto, dessa vez, não era apenas uma sensação interna. A dor tomou uma forma tangível, transformando-se em uma figura humanoide completamente escura. Essa sombra sinistra possuía uma boca que sorria de maneira vil, dois olhos fundos e vermelhos, além de um pescoço longo. Ela ficou ao lado da mulher, colocando uma das mãos em seu ombro esquerdo. A sombra não emitia nenhum som audível, mas a residente do quarto jurava ouvir uma risada distorcida ecoando em sua mente enquanto a figura tremulava levemente, parecendo um rabisco animado.
Com os olhos arregalados e o rosto pálido, a mulher começou a se virar lentamente, na esperança de comprovar se o que tinha visto no espelho era real ou apenas uma loucura de sua mente.
Ao se virar completamente, constatou que não havia mais nada refletido ali. No entanto, isso não mudava o fato de que aquela experiência tinha sido um gatilho intenso para ela, despertando sentimentos de medo, solidão e a sensação de estar presa. Era difícil para ela se manter forte e otimista diante de tudo aquilo, e muito mais fácil se deixar levar pela negatividade.
Sentindo-se tola por temer sua própria imaginação, a residente do quarto cobriu o espelho novamente com ambas as mãos. Ela considerou a ideia de jogá-lo pela janela, mas logo desistiu da ideia. Em vez disso, decidiu ir se sentar no banco próximo à janela, observando o portal que a conectava com o mundo exterior. Para sua surpresa e horror, a figura escura estava lá novamente, sorrindo. Seus olhos agora formavam uma meia-lua, mas em um instante se abriram, brilhando intensamente como um farol. Dentro daqueles olhos, a mulher podia ver o medo.
Desesperada, ela gritou diante da visão aterrorizante que se desdobrava diante de seus olhos. O medo tomou conta de seu corpo e a única reação que pôde ter foi se encolher em posição fetal, chorando e gritando "Vá embora!" repetidas vezes, enquanto batia em sua cabeça com as palmas das mãos. A crise durou até o anoitecer, quando finalmente se sentiu segura o suficiente para se levantar e caminhar em direção à cama. Ela se refugiou sob as cobertas, e depois de algum tempo, finalmente adormeceu.
A mulher acordou no dia seguinte assim que os primeiros raios de sol iluminaram seu quarto, trazendo uma sensação reconfortante de afastar qualquer mal que pudesse estar presente. Mesmo estando acordada, ela permaneceu na cama por um tempo, relembrando o rosto aterrorizante da figura sombria. Sentia-se inconsolável, mas decidiu se forçar a levantar. Sentou-se na soleira da janela, com a cabeça latejando.
Seus olhos se fixaram no portal, onde seu amigo costumava aparecer. Teve uma conversa silenciosa com ele, mas nesse dia havia algo diferente. A boca do amigo não estava borrada; ela podia ver os detalhes do nariz para baixo. Seu rosto tinha um queixo quadrado, como o, e seus lábios exibiam um sorriso radiante como o sol.
Essa visão trouxe certo conforto à residente do quarto, e uma pequena faísca de alegria começou a crescer novamente em seu peito. Foi então que teve uma ideia: ela queria ter um corte de cabelo igual ao de seu amigo. Com essa ideia em mente, procurou uma tesoura pelo quarto e foi em direção ao espelho, sentindo-se temerosa. Ela deu um beliscão em seu braço e puxou o pano que cobria o espelho. Para sua sorte e alívio, a figura sombria não estava lá. Isso lhe deu coragem, mas quando olhou para sua própria expressão no espelho, assustou-se. Suas olheiras estavam profundas e escuras, seus olhos ainda estavam vermelhos, seu cabelo estava desgrenhado e seu rosto estava inchado. Ela parecia exausta e desgastada.
Sentindo pena de si mesma, a mulher se abraçou e fungou antes de prosseguir com o que pretendia fazer: cortar o cabelo. Pegou uma mecha de cabelo e, com uma careta no rosto, deu um corte. Ficou um tempo segurando a madeixa cortada, tentando acreditar no que tinha feito. E então, sem hesitar, continuou cortando, mecha por mecha, até ficar o mais próximo possível do corte que desejava. No entanto, por não ter habilidade, o resultado ficou desigual e malfeito. Mas ela se sentia orgulhosa por ter feito aquilo sozinha. Ao terminar, ficou surpresa com o resultado, fez uma careta e riu de si mesma. Agora, mesmo com o cabelo desigual e curto, ela se sentia mais autêntica e verdadeira consigo mesma.
Após o corte de cabelo, ela voltou para a soleira da janela e compartilhou com seu amigo como se sentia, como uma adolescente falando sobre suas descobertas e experiências.
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