Ao erguer o rosto, viu Valentina com um semblante furioso.
-Aí moleque, - ela disse - que que tu bebeu hein?? Parecia que tava de porre. Eu hein!
Ela resmungou mais algumas coisas antes de Gabriel explicar o porquê que não acordava:
-Tive um outro sonho lúcido com Sir Samael.
Valentina calou-se.
-O que ele disse?
-Nada de interessante. Só treinamos e atualizei ele acerca da nossa situação. Mas ele falou sobre uma missão…
-Que missão?
-Uma missão que ele estava fazendo com Akuma, O Demônio da Servidão.
-Akuma, Akuma, Akuma… Que Akuma?
-Aquele que o Sacro Grimoire diz ser o que roubou as almas daquele clã japonês no século XIV.
-Mas o que o Demônio Justiceiro tem haver com o Demônio da Servidão?
-Não sei.
-Tem algo de errado aí.
-Sim.
-Enfim. Vamos pra Guilda?
-Ah é mesmo! Hoje vamos fazer nossa primeira missão!
-Como pôde esquecer isso rapaz?
Ele riu nervoso e rapidamente se arrumou.
Logo estavam de frente para a sede da Guilda, movimentada como sempre. Apesar disso, a dupla avistou o Sobreiro numa rua lateral a Guilda. Estavam com olhares sérios e não conversavam. Quando o casal se aproximou, André deu um sorriso malicioso e fez um movimento de reverência:
-Lady Valentina! Como vai?
Valentina deu um sorriso educado e respondeu:
-Não muito bem, mas me sinto preparada para a missão.
-Quer algo? Uma água, uma bebida, um café… O Tarcísio vai pegar! Não sinta-se envergonhada em pedir!
Tarcísio deu um olhar mortal em seu companheiro que parecia não se importar.
-Quero começar a missão. Nem dormir direito pensando nela!
-É bom essa animação - elogiou Jonas, o líder.
Antes que André dissesse algo, Miguel acertou uma cotovelada em suas costelas, fazendo-o se ajoelhar. Tarcísio riu e Jonas fez uma careta de vergonha.
-Desculpa por eles - falou o comandante - Eles são assim mesmo.
-Tudo bem - afirmou Gabriel, aproveitando que a sua mestra ajudava o machucado a ficar em pé.
-E quando vamos cumprir a missão hein Jonas? - reclamou o ansioso Miguel.
Jonas deu uma gargalhada e apontou para uma carruagem:
-Entrem.
Todos entraram e ele e seu irmão André ficaram de fora para comandar os cavalos. Logo o veículo estava em movimento enquanto os irmãos cantavam uma música. Seguindo-se alguns minutos, Valentina puxou conversa:
-E então, como vocês vieram parar aqui no bando do Sobreiro?
-Longa história… - sentenciou Miguel.
-Temos tempo - retrucou Gabriel.
-Não o bastante - disse Tarcísio.
-Aproveitamos o tempo que temos - falou Valentina.
Os aventureiros sorriam e Miguel os elogiou:
-Ambos são bons em argumentar e manter uma discussão. Parabéns.
-Mas, respondendo à pergunta - interrompeu Tarcísio, parecendo se concentrar - Eu sou filho de um ferreiro e desde pequeno convivo no mundo dos cavaleiros. Papai tinha vários clientes, cavaleiros ou aventureiros, que pediam pra ele fazer armas metálicas. Eles tinham muito respeito ao papai, pois as armas que ele fazia eram maravilhosas. Por causa disso quis virar um cavaleiro. Apesar dele não falar, eu sabia que aquele ferreiro, um dia, sonhara em ser como aqueles homens.
-Legal, - comentou Biel - bem inspirador.
-Uhum. Sabe, eu era muito amigo de Jonas e André, porque ambos acompanhavam o pai na vinda à ferraria.
-O pai deles é aventureiro?
-Sim. Mas aconteceu um acidente e ele morreu.
-Sinto muito.
-Faz muito tempo, mas até hoje eles sentem tristeza por isso. Eles optaram por tornar-se aventureiros em honra ao pai, e resolveram montar um bando. O primeiro integrante fui eu - disse com certo orgulho Tarcísio.
-E você, Miguel? - quis saber Valentina.
-Eu era órfão - começou ele, olhando a paisagem pela janela da carruagem - Fui abandonado pelos meus pais em uma vala qualquer. Uns moradores de rua me acharam e resolveram cuidar de mim. O nome deles eram Rebeca e Davi, ambos irmãos de sangue. Cresci dependendo de roubos de todo tipo de bugiganga. Uma vez, tentei roubar comida no estabelecimento do Sr. Pedro, pai de Jonas e André. O velho viu e me deu um pontapé bem doído. Jurei vingança e todo dia ia lá pra lutar com ele. Perdi milhões de vezes. Com a minha vinda frequente, acabei virando amigo dos irmãos e claramente, desse abestado - apontou para Tarcísio - Logo o ódio pelo ferreiro acabou, e eu lutava com ele apenas pra aprender a me defender e tal. Quando os irmãos resolveram seguir o legado do pai, me chamaram. Mas eu recusei. Só vim entrar no bando tempos depois, quando meus pais de criação foram assassinados violentamente. Prometi vingança ao assassino e entrei pro grupo do Sobreiro.
-Uau - Gabriel parecia impressionado. - E me diz, como você faz para controlar os animais? Hipnose?
-Não - riu - Aos poucos, aprendi a “conversar” com os animais de rua: cães, gatos e ratos. Quando me tornei aventureiro, descobri que da mesma forma que eu chamava estes animais, eu podia chamar qualquer um. Não sei como explicar, mas consigo.
-Ei, pessoal - gritou Jonas - chegamos!
Se tratava de uma fazenda que segundo Jonas, era o local onde o monstro sempre aparecia. O Sobreiro entrou na casa e entrevistou os moradores, inclusive os escravos.
O dono da fazenda era um fidalgo português chamado Benedito Campos, e tinha uma esposa, Luísa Pereira Campos, e dois filhos já maiores de idade: Marcelo, de dezenove anos, e Felício, de vinte e um anos.
Após ouvir os relatos da família, o Sobreiro criou um plano que seria colocado em prática naquela mesma noite.
-Oh, por favor, durmam na Casa Grande! - pediu o velho Benedito, um homem corcunda de 55 anos, calvo e com uma barbicha grisalha - Não quero que estejam com sono ao cumprir a missão.
-Oh senhor, não é necessário - disse envergonhado Jonas.
-Não, não! Faço questão!
-Desculpe…
-Que isso irmão! - reclamou André - Nós não somos de ferro! Temos que dormir bem à tarde para não ter perigo de estarmos mal-dispostos para cumprir a missão noturna!
-Tem razão! - afirmou o líder - Se não for incomodo, Sr. Benedito, queremos dormir aqui!
-Pois assim será! - falou o Campos, e gritando para dentro da Casa Grande:- Frederica, prepare os quartos de hóspedes! Temos visita! Daniel, diga às cozinheiras para fazerem um farto banquete.
Todo o grupo entrou no grande casarão colonial, onde se impressionaram com a beleza encantadora da moradia.
-Sentem-se - pediu Benedito - Vou ver como estão os quartos.
Dali a alguns minutos, o grupo foi levado até o segundo andar da casa, onde foram mostrados 3 espaçosos quartos de hóspedes.
-Ok, vamos fazer duplas pra dormir nos quartos - disse Jonas.
-Eu durmo com a senhora Valentina - falou André.
-Não, eu durmo - retorquiu Gabriel. “Ora bolas, já não basta vir com galantezas pra cima dela e ainda quer ficar a sós com ela num quarto? Muita cara de pau” pensou.
-Eu sou um adulto, e deves me respeitar. Eu ficarei no mesmo quarto que ela.
-Na verdade, - declarou Valentina - Prefiro ficar com Gabriel. Confio nele e sei que ele não fará nada de errado comigo - deu um olhar de reprovação para André.
Após uma pequena discussão, Jonas foi ficar com Miguel e André com Tarcísio.
Dormiram por um bom tempo, e às seis horas, as empregadas os chamaram para um almoço-jantar. O sol estava se pondo, o que significava que logo a missão iria começar. Comeram e foram para seus quartos se arrumar.
-E aí, animado? - questionou Valentina, trocando de vestido.
-Nervoso é a palavra certa - respondeu Gabriel, tirando sua camisa e colocando outra - Nunca imaginei que um dia fosse virar um aventureiro.
-Seu pai não era um?
-Ele era marinheiro, é diferente.
-É quase a mesma coisa.
O garoto riu e tirou sua calça, pegando outra.
Sacro Grimoire: um grimório escrito por um exorcista italiano que fez várias missões pelo mundo. Nele estão contidos informações sobre demônios, feitiços, plantas medicinais e outras coisas. Quem o utiliza é chamado de “Portador Sagrado”.
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