O mendigo tremeu no lugar e murmurou algo, gemendo baixinho depois e levantando o rosto lentamente para observar seus arredores. E para a surpresa de Fyrr, ele era jovem e bonito, com cabelos escuros curiosos e olhos verde-claros vibrantes. O mendigo levantou lentamente apoiando-se na parede de tijolos suja de fuligem e tinta desbotada, derramando poeira em sua capa curta que caia quase totalmente em seu ombro esquerdo. E um bastão escuro preso na sua cinta do lado direito. Ele cambaleou e aos tropeços parou no meio do beco entre os seus perseguidores e o garoto.
“Era só o que me faltava...”, julgou Fyrr.
- Ce tá fudido, meu parceiro! – gritou um dos jaquetas bloqueando a saída.
- Que porra... vocês não aprendem nunca a sua lição, não é? – murmurou grosseiramente o jovem morador de rua, ele parecia bastante indiferente quanto a sua situação.
- Hãããããããnnnnn... senhores... – diz timidamente o garoto.
- MATEM-ELE!
Então os jaquetas avançaram de armas na mão. Rangendo os dentes, o garoto se afasta rapidamente sem saber o que fazer na hora.
Cercado de estranhos agressivos e sem tempo para processar a informação ou pensar em qualquer coisa, a pior situação possível em que poderia estar. E tudo por estar no lugar errado na hora errada, que maravilha. Os homens corriam tão rápido pra cima do mendigo logo atrás dele que mal conseguia reagir, instintivamente recuando enquanto suas mãos seguiam até o interior do véu amarrado na cintura.
Clang!
Uma lâmina oculta repentinamente intercepta a espada curta do jaqueta que tomava a dianteira, prestes a esbarrar na criança que não se importava em ferir para capturar seu alvo. E a espada oculta vinha das mãos do mesmo mendigo que menosprezou há poucos segundos, os eventos seguiram tão rápido que não houve tempo dele perceber o jovem espadachim sacar sua arma e bloquear a lâmina do inimigo.
Seus olhos se encontraram naquele momento, e ambos puderam perceber muito um sobre o outro numa fração de segundos com aquela reação.
- Não me fode, moleque, vaza! – rudemente expulsou o mendigo espadachim.
Rangendo a mandíbula, o jaqueta bloqueado arriscou um chute direto que o mendigo desviou se virando e atacou novamente arriscando outro golpe de cima, mas acabou subestimando a reação do oponente e abrindo a guarda, se aproveitando disso, o jovem o corta num golpe diagonal limpo no torso, abrindo um corte perfeito de seu abdome até o ombro de onde jorrou uma quantidade grande de sangue.
O primeiro jaqueta da trupe caía lentamente enquanto os outros fechavam o círculo em volta do mendigo e de Fyrr, que se atentava para todos os lados em busca de uma solução para escapar, mas os olhos selvagens dos jaquetas deixaram bem claro que argumentação não cairia bem, e não havia garantia nenhuma que o mendigo iria ajuda-lo. Noutra fração de segundo o espadachim bêbado se posicionava para receber os dois jaquetas que vinham do seu lado, o flanqueando com as armas em posição de ataque, e do outro lado, quatro deles vinham na direção dele. Correr para o lado? Tentar passar por eles na surdina? O que fazer?
O que fazer?
Essa questão queimou no seu cérebro tão rápida e ineficaz que calorias preciosas de seu lanche anterior foram gastas atoa, e em resposta, seu instinto tomou o lugar e o fez agarrar o cabo da adaga que guardava na roupa e a sacá-la de uma vez. Seus olhos se encontraram com os do jaqueta que corria até ele, talvez tentando agarrá-lo para usá-lo de refém, o que foi seu maior erro, já que antes de poder terminar de estender seu braço para agarrar a criança “indefesa”, ele saiu voando, girando no ar, quando a adaga numa última fração de segundo se expandiu para o tamanho original da espada que era, e o corpo da raposa imediatamente respondeu a sacando e partindo o braço do homem num golpe limpo.
- Aaaaahhhhhhh!!!!!!!!! – rugiu em dor o jaqueta, se afastando dois passos de surpresa. Os outros observaram ao seu redor extremamente surpresos assim como a raposa, que dominada ainda por um instinto desconhecido, arrancou do chão sujo e atravessou o jaqueta num segundo golpe em sequência descente.
Parado atrás do seu inimigo, ele agora tinha levado metade de sua panturrilha, derrubando o jaqueta em agonia no chão.
“Que porra... foi essa?”, ele pensou. E olhou tremendamente excitado pela adrenalina e medo para a longa espada azul-anil que segurava com as duas mãos. Assim que a sacou, ele pôde literalmente sentir uma informação nova e desconhecida entrando em seu cérebro, se adaptando a ele e lhe fazendo agir como se empunhasse uma lâmina há anos, mesmo sem nem sequer já ter tocado numa faca de cozinha. Aquela espada, ela estranhamente o ensinou a usá-la da melhor forma possível, o transformando num espadachim.
“Então foi isso o que ele quis dizer? Hahaha valeu, Celenio...”, agradecendo em pensamentos, ele se virou confiante para os outros jaquetas trocando de olhares do seu aliado caído para a criança, sem perceber que sua chance de escapar já tinha aparecido, mas se enchendo com uma rasa confiança de que poderia escapar ileso de qualquer situação.
Do outro lado, o mendigo havia desviado de um golpe do jaqueta de bastão, o partindo em dois num golpe limpo enquanto se agachava e ainda de costas para o oponente, estocou o jaqueta com a espada oculta bem no peito do inimigo, ao mesmo tempo o outro vinha avançando rapidamente tentando estocá-lo com a espada curta que carregava.
O jovem espadachim arrancou a lâmina fincada no peito do inimigo e desviou para o lado, estendendo a perna e chutando o pé do segundo, que tropeça e termina de esfaquear o próprio aliado, que cospe sangue em seu rosto. Em seguida, tendo prendido a arma do oponente no corpo do outro, o mendigo finca a sua no pescoço do segundo e os derruba no chão, ainda com a face de surpresa mortal no rosto.
Então do outro lado observa aquela estranha criança trocando dois golpes rápidos com um dos jaquetas que o flanqueavam, um golpe do jaqueta fora bloqueado por um golpe diagonal que o pressionou e outro em meia lua que o fez recuar para trás, e não era pra menos. Mesmo que a criança tivesse claramente uma força bem menor e carregasse uma espada quase do seu tamanho, ele a movia com uma maestria insana e seus movimentos não apresentavam nenhum desperdício. Era um mestre no uso de sua arma. E não parecia em nada uma arma comum, tanto em sua cor quanto seu formato e designe.
“Instrumento mágico...”, concluiu o mendigo, limpando o sangue em sua espada com um movimento brusco e o jogando no chão.
Finalmente cercado, a criança estoca velozmente o seu oponente de frente na perna e o desequilibra, avançando contra ele, ainda surpreso pelo ataque, e desviando de um golpe de bastão que vinha por trás de si, freando seu avanço e ao mesmo tempo se virando na direção deles, ele acerta o oponente nas costas com o cabo da espada e o empurra em cima dos outros dois jaquetas, que caem empilhados uns nos outros.
- Porra! Não fode! – gritou um deles, embaixo de seus aliados.
- Hahahaha! Otários! – exclamou a raposa, vendo sua obra com deleite, e admirando o brilho fraco da lâmina da sua espada, impressionado com sua função especial.
Agora bastava correr para fora do beco, sim, apenas correr, mas tinha um problema nessa ideia que a criança encarou quando olhou para o fim iluminado daquele beco. A silhueta escura de um jovem que não devia ter mais de vinte anos carregando uma espada numa das mãos.
O que fazer? O que o mendigo aleatório que estranhamente é um ótimo espadachim faria com ele após o que viu? Olhando mais para o lado e vendo os corpos dos jaquetas mortos friamente por ele, ele notou que o jovem não era do tipo compreensível. Sua frieza terminava apenas aos jaquetas ou também chegava nas crianças que carregavam armas duvidosas? Ele não tinha um comparativo bom para saber se tinha chances de vencê-lo, ele só saberia após trocar um ou dois golpes com o espadachim e sobreviver, a espada o diria se poderia ou não vencer, pela informação que recebeu, as chances eram altas, a proficiência da espada era alta, mas será que seria o suficiente?
- Atrás de você... – apontou o jovem com o olhar, olhos verdes e claros escurecidos por sua sombra.
- Hã?
Os três jaquetas estavam se levantando e reorganizando suas ideias, prontos para atacar tanto ele quanto o mendigo novamente. Apesar de ter tido sua chance, ele continuou estando cercado dos dois lados, e talvez agora as coisas estivessem piores ainda. O que fazer?
Mata-los? Ele conseguiria eliminar uma vida humana? Provavelmente não, não estava acostumado a tirar vidas assim... poderia apenas forçar a passagem entre os jaquetas, já que eram obviamente os mais fracos. Não... se eles ficassem vivos e se separassem dali para informar os outros, informações desagradáveis sobre ele correriam por ali, e ele acabaria sendo alvo dos jaquetas também.
Talvez, ele pensou, a solução mais simples fosse a melhor, a boa e velha intimidação.
- Ei! Seus cretinos! Vocês estão cegos ou a surra esculhambou seus cérebros! – gritou o garoto, imponentemente cravando sua espada no chão e estufando o peito.
Os jaquetas olharam de início confusos em sua direção, até que a adrenalina em suas veias abaixou, e uma clareza maior caiu sobre o ambiente ao seu redor.
- Não estão vendo? Vocês não são páreos pra nós dois! Se mandem e chamem reforços ou pelo menos alguém que dê pro gasto! Ou vou partir vocês em dois!
O cheiro de sangue, as poças vermelhas que se espalhavam por ele e os corpos mortos de três dos seus, mais um que estava desmaiado há pouco metros do garoto indefeso pela dor dos ferimentos e pela hemorragia que não parava.
Então eles perceberam seu erro e começaram a suar frio. Com os dentes rangendo, recuaram lentamente, com a imagem de uma criança de peito estufado com uma espada grande zombando de sua competência queimando, e claro, a imagem de uma silhueta escura contra a luz no fim do beco enviando a eles uma aura assassina gélida.
Assim todos recuaram, deixando o lugar quieto outra vez.
Então se virando, o garoto olhou mais uma vez na direção do problema mais atual. O mendigo espadachim.
- Então... você vai me deixar passar também? – ele questionou.
Trocando olhares perscrutantes tentando ler um ao outro, ambos se encararam, por longos segundos cheios de silencio pesado, a atmosfera continuou densa e mais densa, e o cheiro de sangue e terra aumentava.
- Depende. – Finalmente diz o jovem – Essa sua espada é um instrumento mágico, certo?
- E se for? – “Que merda é um instrumento mágico?”.
- ... você não é daqui também... e não está com eles, pelo visto... hunf, tanto faz... – diz o jovem, então guarda sua espada na banha que deixou no chão, ao lado do cadáver de um dos oponentes, e friamente a guarda, dando as costas para o beco e entrando na rua.
- Huuuuuuuuuuuurrhhh! Caramba! Que alívio... – murmura o garoto, suspirando profundamente.
Olha em volta para a quela confusão e caminha com cautela até o fim do beco, confirmando rapidamente se estava seguro com seus sentidos apurados, e então sai outra vez, encolhendo sua arma para o tamanho de uma adaga e a guardando na roupa.
– Cara, os mendigos daqui são muito estranhos...
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