Fazer parte do jogo era uma coisa, ter coragem era outra completamente diferente, Ian queria descobrir mais sobre Dante e o Inferno, mas ele não tinha culhões para perguntar.
— Ainda bem que você apareceu! — disse Mariano assim que Ian chegou na boate — Ontem foi um desastre total! O bar estava vazio antes mesmo das 22 horas, as pessoas começaram a ir embora quando ouviram o boato que Ivy não cantaria mais e Dante não apareceu... Você está bem? Ele não te machucou, né? Seu segredo está seguro comigo, eu nunca contei quem você realmente é, eu só passei o seu contato. Ainda bem que você usa aquela foto onde só aparece sua boca e o seu queixo e o seu nick é a letra I...
— Está tudo bem — disse Ian exausto interrompendo o monólogo do chefe, ele já tinha problemas demais para enfrentar e coragem de menos, tudo que ele queria era dizer o quão essencial ele tinha se tornado para Luxúria e exigir um contrato que pagasse todos os direitos trabalhistas e assim ele poderia se livrar do trabalho de merda no escritório, mas sua voz não o obedecia e tudo que ele pôde dizer foi — Eu irei trabalhar normalmente.
— Como bartender? Ou como Ivy? — perguntou Mariano ansioso.
— Os dois. — respondeu Ian derrotado.
— Sabia que você não seria um escroto com quem sempre te ajudou. — disse Mariano radiante saindo da sala de descanso e deixando Ian submerso em pensamentos.
Como o bom covarde que ele era, foi mais fácil voltar a trabalhar com o rabo entre as pernas do que enfrentar o seu chefe e exigir seus direitos. Agora ele entendia o motivo de todas aquelas mulheres se recusarem a cantar quando Dante começou a frequentar a boate e devido à sua ignorância ele estava preso naquela situação e sendo obrigado a enfrentá-la.
Ele sentiu um pouco de alívio quando soube que Dante estava acompanhado na área VIP, talvez ele tenha cansado de brincar com Ivy, no entanto, as coisas pareciam ainda mais alarmantes, todas as mulheres reunidas tinham características parecidas com a dela e para piorar o Rei do Inferno exigiu a ajuda de Ian sobre os gostos dela.
Inteligência era algo que não faltava em Ian e ele sabia que deveria aproveitar a oportunidade para ser um tipo de agente duplo, o problema era que ele sempre tremia da cabeça aos pés quando estava com Dante. Ele não tinha nem coragem de intimar Mariano e fazer um acordo decente, mas talvez Ivy teria.
Após seu show, Ivy esperou que Dante aparecesse novamente, mas para sua surpresa não houve nenhum tipo de contato, talvez ele estivesse ocupado demais com todas aquelas mulheres e tenha realmente encontrado uma substituta à altura, com esse pensamento ela conseguiu respirar aliviada, mas ainda precisava de algumas precauções, ela precisava saber tudo sobre Dante.
— Você me chamou? — perguntou Mariano entrando no camarim improvisado — Não é para me dizer que desistiu, não é?
— Não exatamente — disse Ivy, ela estava sentada com uma postura ereta e confiante, parecia até mais alta que Ian dessa forma, seus olhos brilhavam e ostentava um sorriso malicioso enquanto cruzava as suas longas pernas.
— Você não pode desistir, você é essencial para a boate. — rosnou Mariano.
— Exatamente, querido — disse Ivy batendo palmas — Eu sou es-sen-ci-al.
— Que papo é esse de querido, seu desgraçado? — perguntou Mariano entre dentes.
— Não precisa ficar irritado, eu só quero saber o quão importante eu sou para o seu estabelecimento, querido. — disse Ivy dando ênfase na última palavra.
— Se você desistir de cantar e Dante decidir que a Luxúria não é mais um dos portões do Inferno, nós vamos ter que fechar. — Mariano tentou não parecer patético, mas apesar de sua postura segura, o seu olhar estava cheio de súplicas.
— O que você quer dizer com portão do Inferno? — perguntou Ivy curiosa.
— Porra, Ian! Isso é... — Mariano perdeu o ar com o olhar penetrante de Ivy, ele nunca havia percebido que Ian podia ser tão intimidador, ele sempre fora tão doce e inocente, apesar de inteligente ele era totalmente manipulável e por isso o chefe conseguia pagar para ele uma mixaria e exigir que ele trabalhasse muito mais que todos os outros funcionários, aquela expressão parecia de uma pessoa totalmente diferente. — A boate tem um contrato com Dante e ele ameaçou cancelar caso você não cante mais na boate.
— Você está me dizendo que a pura existência da Luxúria depende de mim? — perguntou Ivy colocando o cabelo atrás da orelha delicadamente.
— Exatamente isso que eu estou dizendo, porra! Tá surdo agora, caralho?! — disse Mariano batendo com força na cômoda, ele era um homem explosivo e costumava intimidar Ian com isso, mas não essa noite, não com Ivy.
— Estou te ouvindo, mas não estou particularmente satisfeita... — ela fez uma pausa dramática e prosseguiu -— Se eu sou essencial para a existência desse seu belo estabelecimento, como você diz, por que caralho eu ganho tão pouco? — Ivy se levantou e andou na direção de Mariano, Ian era um homem alto com 1,79 m, mas como Ivy e sua postura ajustada ele ficava um centímetro mais alto e somando o seu salto de 10 cm, Ivy se tornava uma pessoa de quase dois metros, o homem corpulento foi encarado de cima para baixo e prensado na parede por ela — Se você quer continuar com o seu negócio e muito provavelmente com a sua vida você vai ter que cumprir as minhas condições de agora em diante.
— Q-que condições? — estremeceu Mariano.
— Um — disse Ivy levantando um de seus dedos longos — Eu quero minha carteira assinada com todos os direitos trabalhistas, vale-transporte, vale-alimentação, INSS, plano de saúde, plano odontológico, 13º, férias, uma folga por semana e claro um substancial aumento no meu salário de merda.
— Mas nenhum funcionário da boate tem plano odontológico — titubeou Mariano.
Ivy alisou o rosto oleoso de Mariano com uma cara de desprezo e disse:
— Se você quiser que eu continue me apresentando, terá que cumprir todas as minhas exigências, querido.
— Eu darei um jeito — disse Mariano afastando a mão de Ivy — Quais são as outras exigências?
— Dois — disse Ivy levantando dois dedos longos depois de limpá-los com nojo na camisa de Mariano — Ian tem que continuar atendendo Dante na área VIP todas as noites, ninguém poderá substituí-lo, então nos meus dias de folga a boate ficará fechada, sugiro na segunda-feira, o movimento é próximo de zero de qualquer forma, vai ser mais barato para você dessa maneira.
— Se você não vier, Dante não virá e se ele não vier não tem sentido abrir a boate — disse Mariano analisando a situação — Tudo bem, garoto, vou atender a porra das suas exigências.
— Mais uma coisa — disse Ivy levantando mais um dedo longo — Me conte tudo o que você sabe sobre Dante e o Inferno. — Os olhos de Ivy brilhavam como se estivesse em chamas, fazendo todo o corpo de Mariano recuar.
En prise é uma expressão de origem francesa que se refere a uma peça em posição de ser tomada.
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