Parte 1: Nascer
And hey, you, don’t you think it’s kinda cute
That I died right inside your arms tonight
That I’m fine even after I have died
Because it was in your arms I died.
(Mother Mother – Arms Tonight)
Goodbye my friend
Life will never end
And I feel like you
And I breath on truth
Love is the life breath of all I see
Love is true life inside of me
And I know you somehow
As I hold you in my heart, in my heart
(Anathema – Internal Landscapes)
LORENA
CAPÍTULO UM Sobre como acordar de repente não se parece com suco de framboesa
L.I.F.E.G.O.E.S.O.N What you don't have now will come back again You've got heart And you're goin' your own way — Noah and the Whale “L.I.F.E.G.O.E.S.O.N”
Lorena não era claustrofóbica, mas acordar naquele lugarzinho apertado, escuro e gelado foi uma das piores experiências de sua vida. Não havia o que ver ou ouvir por ali.
Trêmula, tateou em volta, se dando conta de que estava trancada. Um gemido de pavor escapou dos lábios secos. Ela gritou e socou as paredes de metal. Uma caixa comprida e gelada onde o seu corpo cabia perfeitamente. Estava nua, coberta apenas por um fino pano que ela imediatamente supôs que seria branco. Ainda que não se lembrasse de nada, bem lá no fundo, uma parte dela já desconfiava da verdade.
Inspirou fundo e gritou por socorro.
Nenhuma resposta.
Lorena ficou imóvel, ouvindo o silêncio. Finalmente se dando conta da origem daquele vácuo.
Seu coração não batia.
Seu peito não subia ou descia com respiração.
Não havia respiração.
— Mas o que…
Esfregou o rosto. Ela já tinha tido pesadelos antes, mas aquele ali merecia um prêmio. Será que era a tal paralisia do sono de que tanto ouvira falar? Daqui a pouco eu vou acordar na minha cama para mais um dia chato, ela se forçou a pensar. Ignorou o tremor das mãos e as acomodou sobre o peito, tentando se ajeitar, mas o gesto só serviu para evidenciar o fato de que ela não estava respirando.
Fato.
Puro e simples.
Forçou o ar a entrar nos pulmões e ficou ali por minutos (?), horas (?), dias (?), cada vez mais inquieta. Será que tinha se esquecido de programar o despertador? Não, não. Ela não podia faltar no trabalho.
Voltou a socar e chutar as paredes; era como se elas encolhessem ao seu redor. Sua mente buscava uma explicação, mas nada surgia. Continuou socando e gritou com toda força. Isso só serviu para fazer a sua cabeça girar e o estômago embrulhar. Um pensamento bobo de que talvez estivesse morta e enfiada numa gaveta de necrotério cruzou a sua mente por um segundo.
— É só um pesadelo — disse para si mesma, e a forma como o som ecoou pelo metal era realista demais para um sonho.
Tentou se acomodar como pôde. Precisava pensar direito se quisesse sair dali. Olhou ao redor mais uma vez, reparando que não havia nenhuma fresta de luz. Desistiu de esperar que os olhos se acostumassem com a escuridão. Afinal, não haveria muito para ver ali.
Era só uma caixa grande.
Nada além disso.
Uma caixa grande.
Um caixão.
Esfregou os olhos.
— Pensa, Lorena, pensa…
E então apoiou as mãos no tórax e esperou. Nada. Nenhum batimento. Nenhum coração acelerado. Por pior que se sentisse, os pulmões e o coração permaneciam imóveis, frios, incapazes de emular a emoção que ela experimentava. Ainda sentia dor, sim, e uma pontada aguda preencheu o peito, acompanhado de um vazio total. Uma angústia que devorava cada pedacinho da pele. Lá estava o seu corpo imóvel, jogando na cara dela que, indiscutivelmente, estava morta.
E aquela palavrinha dissílaba a fez desmoronar. Veio primeiro um soluço dolorido, e então as lágrimas precipitaram dos olhos. Lorena agarrou a raiz dos cabelos e balançou a cabeça, incrédula. Não queria morrer. Não queria ir embora sem ter feito nada da vida. Não agora, com apenas dezoito anos. Pensou em tudo aquilo que nunca faria. Pensou em todos os sonhos que deixaria para trás, estatelados no asfalto.
Asfalto!
Aos poucos se lembrou do acidente. O carro, os sons, a dor.
Ela não tinha sido a melhor pessoa do mundo e não era religiosa, mas nunca fora particularmente má. O que fizera para merecer aquele fim? Pensou nos pais e em como estariam se sentindo. Será que já sabiam? Quanto tempo tinha passado? Lágrimas voltaram a surgir quando pensou no rosto da mãe. O que as pessoas estariam pensando? Será que deixariam recados e mensagens? Ou levariam flores e escutariam as músicas que associavam a ela? Será que alguém estava triste? Ou será que ninguém se importava? Os colegas de trabalho sequer notariam a sua ausência?
Ou… talvez nem estivesse morta, pensou, com um sorriso. Talvez alguém tivesse se confundido. Estar paralisada em um sonho horrível fazia muito mais sentido. Era a explicação mais plausível.
O som de passos a tirou dos devaneios. Prestou atenção. O que faria? Um escarcéu para que a tirassem dali? Mas ela estava morta. O que aconteceria se alguém visse uma morta se mexendo?
Por sorte, nem precisou tomar atitude alguma, pois o som de gavetas se abrindo ficou cada vez mais próximo.
Pof! Pof! Pof!
O barulho cada vez mais perto.
Assim que a porta dela foi aberta e a maca foi puxada, ela soltou um gritinho. Seus olhos foram cegados pela forte luz do lugar. Lorena franziu o cenho e se encolheu debaixo da mortalha.
E foi aí que ela viu aqueles olhos verdes.
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Obrigada!
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