Todo dia a mesma rotina, acordar antes do sol nascer para ir trabalhar nas minas até a exaustão e retornar à estalagem antes dele se pôr. Não era uma vida luxuosa, na verdade era oposto disso, o trabalho era simples e ninguém se importava com quem estava fazendo, dava pra ver isso só de observar o resto dos mineradores. Alguns eram apenas homens simples, outros claramente tinham seus próprios segredos. Parte acreditava que encontraria algo ali que poderia deixá-los ricos e viver vidas tranquilos, mas a maior parte trabalhava pra sobreviver.
Seus poderes facilitavam bastante o trabalho, a herança de Ada o dava um vínculo com a terra que o permitia perceber coisas que vão além dos sentidos comuns. Para ele era fácil achar o que possuía valor na rocha. Um pouco de minério, uma gema pequena que “acidentalmente” acabou encontrando ou qualquer coisa que pudesse pagar por um teto e suas três refeições sem atrair olhares curiosos ou invejosos.
Evitava chamar atenção, já que não queria que descobrissem que ele tinha uma herança e despertar muito interesse seria um problema. Não iria demorar até que rumores se espalhassem, rumores sobre o garoto que sabia onde cavar pra tirar coisas com valor de dentro das minas. Iriam querer saber sobre o quão poderoso era, iria se tornar interessante e todos iam começar a fazer perguntas. Rumores e boatos em uma cidade pequena se espalham rápido e podem chegar até os membros da Ordem e aquilo que a Ordem sabe, seu pai acabaria sabendo.
Ao fim da tarde o crepúsculo se escondia atrás de uma das montanhas, mas os raios de luz alaranjados, rubros, intensos e vibrantes ainda podiam ser vistos a contornando. Mais um dia de trabalho havia se encerrado e podia voltar a estalagem. Enquanto descia a montanha sentia os calos em suas mãos latejarem, estava exausto, as costas doíam e as pernas tremiam a cada passo, mas todo esse esforço era penitência leve comparado ao seu erro. Enquanto olhava suas mãos doloridas, sua mente o fazia ver coisas. Todo aquele sangue e a voz dela martelando em sua mente, suas palavras cruéis, porém realistas. Sentiu a garganta dar um nó, seu peito doía e as lágrimas começaram a se formar em seus olhos. Apertou o passo, quanto antes chegasse à estalagem mais cedo poderia comer e dormir.
A estalagem de Rubens Barbosa era no que se resumia a vida noturna da vila. Um estabelecimento Grande para os padrões de um lugar pequeno. Um prédio de três andares, cada qual com sua devida função: o térreo servia como bar, sempre lotava a noite e tinha fama na cidade “bebida barata, gelada e ambiente de boa qualidade”, quase um bordão do Velho Barbosa; o primeiro e segundo andares são um albergue e aqueles que trabalhavam na mina pagavam mensalmente para ter onde morar; o último andar são os quartos para passar a noite, que não são muitos, pois a cidade quase não recebe viajantes.
Todas as mesas do bar estavam ocupadas e o balcão lotado mesmo que tivesse cegado cedo. Contudo, por ser um rapaz esguio, Ada deu um jeito de se enfiar no meio da comoção. Muitos mineradores buscavam se recuperar do dia gastando o que haviam ganhando em cerveja.
Assim que se aproximou do balcão foi recebido de forma calorosa por Barbosa, que foi seu senhorio pelo último mês. No tempo que estava lá, Ada conheceu um pouco dele, sempre lhe pareceu um homem focado e responsável, voltado a seus negócios e pai solteiro de dois filhos. A mais velha, uma moça de 19 anos chamada Marcia, cuida da cozinha do bar e do albergue e é noiva do filho do prefeito. Sua personalidade era semelhante a de seu pai e sempre passou a impressão de ser alguém muito disciplinada; e Roberto, conhecido como “Beto”, era um rapaz de 17 anos, a idade de Ada, a quem o pai ensinava o ofício de administrar o lugar. Beto era bem diferente de seu pai e irmã. Não gostava de pressão ou de responsabilidade e vivia confuso sobre o que fazer com sua vida e qual seria seu papel no mundo. Desde que Ada chegou fizeram uma amizade e Beto compartilhava com ele as suas inseguranças.
Barbosa assim como Ada também possuía uma herança. Era capaz de criar e manipular gelo, no entanto, não tinha habilidades lapidadas e Ada só o viu usar para gelar as bebidas. Heranças não eram comuns e nem todos que as possuem tem um talento real para controlá-las. Esses geralmente não as usavam e quando usavam eram em tarefas ordinárias para facilitar seu cotidiano. Beto também despertou a Herança de gelo do pai. Após ficar tentando repetir o que Barbosa fazia, sempre prestando atenção quando ele explicava como funcionava, um dia aconteceu. Beto contou que isso criou um atrito nas relações familiares, pois seu pai queria que ele tocasse o negócio da família junto da irmã. Entretanto, desde que despertou a herança Rob estava inseguro com o caminho que iria trilhar. Ada era muito cuidadoso para não despertar notoriedade, sempre fingia não era capaz de entender muito pelo o que Beto estava passando e mentia para o amigo, dizendo que ter uma herança parecia algo legal e que também queria poder despertar uma.
Ada pediu por uma refeição e algo para beber e assim que a bandeja foi entregue em suas mãos adquiriu um novo desafio surgiu, encontrar um lugar que pudesse sentar e comer. O balcão era inviável estava cheio de bêbados desesperados para serem atendidos e algum deles podia derrubar o prato, ou derramar a própria bebida ou a de Ada. As mesas também não pareciam promissoras, estavam cheias e não era amigo de ninguém que as ocupavam para perguntar se podia se juntar. Ela já estava se acostumando com a ideia de que comeria em pé ou sozinho em seu quarto mais uma vez, foi quando avistou ao fundo do salão uma mesa que parecia estar vazia.
Partiu em direção ao lugar o mais rápido possível, passando pelos pequenos espaços entre as mesas e esquivando-se de bêbados para salvar sua janta, mas assim que passou por um homem que bloqueava parte de sua visão percebeu que havia alguém ocupando ao lugar. Era uma figura melancólica e gasta, um homem magro, com olheiras profundas e olhar perdido, bebia sozinho e não era sua primeira garrafa, haviam algumas vazias na mesa, assim como cinzas e bitucas de cigarro junto de um maço quase vazio.
Antes que desistisse da ideia de ocupar um lugar na mesa isolada, tal como uma ilha de solidão e tristeza em um vasto mar de boemia, sentiu-se compelido a fazer companhia ao homem triste. Ada não sabia lidar com esses sentimentos, já não era capaz de aceitara própria tristeza que diria a dos outros, sempre dava o seu máximo para ajudar as pessoas com sua melancolia. Todo esse esforço o tornou um carismático, sabia como conversar e alegrar as pessoas, as freiras viviam dizendo que ele era profundamente irritante, porém efetivo em seu objetivo.
Tomou coragem e caminhou até a mesa, estava determinado a conquistar um lugar para se sentar e esse lugar lhe seria assegurado enquanto tentasse melhorar o dia daquele poço de desalento, isso ou faria sair da mesa por deixa-lo irritado, ou seja , uma situação onde só haveriam vitórias.
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