Pedro estava extremamente exausto. O rosto ainda vermelho por conta da bolada. Um grande relógio tiquetaqueava na parede oposta a que estavam sentados ele e o pai. Ricardo não falou nada do caminho de 35 minutos de carro até o consultório.
Os olhos fundos de Pedro agora deixavam clara a sua perda de peso. Ricardo não notara que o garoto estava raquítico. Talvez estivesse preocupado demais com a carreira do filho do meio que era tenista profissional. Ricardo era também seu empresário.
Pedro não sentia tanta falta do pai, apesar das diversas viagens. Talvez tivesse se acostumado à ausência, mas lembra bem que na infância era mais difícil.
Sua mãe também tinha seus compromissos. Ela é gerente comercial de uma grande rede empresas. Uma mulher de negócios viciada em trabalho que se atolava em problemas corporativos eventualmente solúveis para não lidar com questões de sua alma.
Enquanto Pedro olhava o ponteiro do grande relógio que descia, recebera um SMS.
Marcelo: Pedron, vc tá bem?
Pedro visualizou, mas não quis responder. Havia algum tempo que percebera a forma como Marcelo o olhava. Talvez Pedro entendesse Marcelo mais do que a ele mesmo.
Pedro tinha medo de Marcelo. Pedro não queria ser gay. Ele já havia beijado num jogo de verdade ou desafio uma garota mais velha chamada Carolina. Pedro não era gay, pois gostara. Ou seria? Pedro teve outra crise de choro antes que conseguisse responder às suas próprias perguntas.
- Pedro Carneiro. Disse o médico psiquiatra que atenderia Pedro a partir de então.
Depois de algumas perguntas Pedro finalmente parou de chorar.
- Doutor, meu irmão mais velho tinha transtorno bipolar. O pai de Pedro logo informou ao médico acreditando ser esse o diagnóstico.
Pedro nunca ouvira falar desse irmão de seu pai. Aliás, nunca sequer soube que tinha ou tivera um tio por parte de pai, cresceu jurando que o pai era filho único.
Ao fim da consulta, o médico achou por bem medicar Pedro já que ele não dormia havia dias. Antes que chegasse em casa naquele final de tarde Pedro dormiu com o rosto apoiado no vidro do banco do passageiro. No outro dia à tarde acordara com o celular que na cabeceira vibrava.
Era Marcelo.
- Pedro. O que tá acontecendo?
Indagou Marcelo de súbito com uma voz grave.
Pedro demorou alguns segundos até que finalmente respondeu.
- Não é nada, Marcelo. Só tou doente, mas vai passar.
- Tou aqui na esquina já.
- Tá bem.
Pedro levantou-se e viu que na cabeceira de sua cama estavam dois frascos de medicamentos. Seu coração ainda estava amargurado e sequer queria receber Marcelo.
Pedro ergueu-se como se seu corpo pesasse uma tonelada. Jogou a perna direita para fora da cama em busca do chinelo, mas encontrou apenas o tapete macio enquanto se desvincilhava da coberta.
Levantou enquanto ainda bocejava e logo pusera a mão esquerda dentro das calças como sempre fazia ao levantar.
Abriu a porta do quarto e foi até o banheiro enquanto coçava os olhos. Ouviu tocar a campainha.
Tirando o samba canção estava como veio ao mundo. Abriu a porta do box de vidro que rangeu em resposta às brusca força empregada por ele. Abriu a água quente e deixou que caísse sobre sua mão. Não pensava em nada. Sentia um buraco em seu peito, e nem sabia explicar por qual motivo, mas estava triste.
Sentou-se no chão enquanto a água agora um pouco mais fria caía sobre seus cabelos castanhos. Pedro mirava seus pés quando começou a chorar. Sentia que não queria viver.
Ouviu em seguida o ruído da porta do banheiro que rangeu enquanto uma sombra alta e esguia atravessava em câmera lenta a distância de três passos. Era Marcelo. Ele, tirando os chinelos, sentou-se contra a porta que acabara de fechar sem dizer nada. Pedro apenas chorava. Marcelo suspirava profundamente e não dizia nada. Não havia o que dizer.
Marcelo olhava fixamente para os azulejos azuis do banheiro. Ele tinha medo de perder Pedro qur, afinal, era seu primeiro amor.
No dia anterior Marcelo saiu do colégio e foi até a casa de Pedro.
Ao chegar ao portão foi recebido pelo husky Spok que veio balançando o rabo e latindo de modo a anunciar a presença do humano.
A avó de Pedro veio com o molho de chaves vagarosamente enquanto Spok enrolava-se entre suas pernas.
Olá meu filho, já almoçou?
Já almocei sim dona Judite, obrigado.
Disse Marcelo que sequer havia comido desde que o pai de Pedro o buscara na escola.
Vamos entrar. Acho que preciso lhe contar algo.
O coração de Marcelo tremeu. Sua boca secou enquanto imaginava o pior. Sentou-se e num ato de ansiedade apanhou uma almofada cheia de rendas e colocou sobre o colo.
Há trinta anos atrás eu perdi meu Hector. Fez exatamente trinta anos no mês passado.
Marcelo indaga-se sobre que falava a dona Judite.
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